Estamos a pouco mais de cem dias de mais uma Copa do Mundo. Não é por acaso que os amantes do futebol ficam tão ansiosos pela chegada do torneio. É difícil explicar o fascínio que o Mundial exerce em nós. A história do campeonato é muito bonita e é isso que faz dele um sucesso. Todo jogador quer fazer também sua história, assim como Pelé, Maradona, Puskas, Zidane, Cruyff, Romário, Ronaldo, Gigghia e tantos outros consagrados na Copa.
Por isso, começa aqui na Domingueira o especial "Naquela Copa...", onde vou relembrar momentos curiosos de cada um dos 18 torneios disputados até hoje. Muita coisa você já deve estar cansado de saber, por isso, meu objetivo é contar fatos diferenciados, que justifiquem a construção da imagem que temos da Copa do Mundo: de um torneio ímpar.
Começamos com contos dos anos 1930, quando tudo começou.
Naquela Copa de 1930... o Brasil era carioca
O primeiro torneio mundial de seleções organizado pela Fifa tinha o objetivo de, finalmente, estabelecer qual era a nação mais forte no esporte bretão. Mas não foi possível definir isso já que os europeus boicotaram o torneio que seria realizado no Uruguai. Apenas quatro países do Velho Continente foram à América: França (de Jules Rimet, presidefente da Fifa na época), Romênia, Iugoslávia e Bélgica.
O motivo do boicote era justamente o fato de o Uruguai sediar o campeonato. A Fifa foi justa ao agraciar nossos vizinhos com o Mundial, já que eles eram bicampeões olímpicos (1924 e 1928) e iriam comemorar o centenário da Independência em 30. Foram premiados com o título, batendo a Argentina na final por 4 a 2, mas sem enfrentar grandes adversários. Até hoje, os títulos das Olimpíadas são o que fazem a fama da Celeste daquela época.
Mas o fato mais curioso da Copa de 1930 foi a participação vergonhosa do Brasil. Nem tanto pela eliminação precoce na primeira fase (derrota para Iugoslávia por 2 a 1 e vitória contra a Bolívia por 4 a 0; segundo lugar no grupo). Sim pelo racha entre São Paulo e Rio de Janeiro. Os paulistas queriam mais membros na comissão técnica, mas a CBD (atual CBF), sediada no Rio, não aceitou.
Com isso, a comissão e o time brasileiro eram formados cariocas. A única exceção era Araken Patuska (foto), jogador do Santos, porém, brigado com o Peixe e que se meteu entre 24 que foram ao Uruguai. Jogadores como Feitiço e Arthur Friedereinch ficaram de fora por conta desse entrevero de cartolas. Dizem que com eles a história seria outra...
Naquela Copa de 1934... um brasileiro foi campeão
O segundo Mundial de Seleções teve dois feitos inéditos até os dias hoje. O primeiro se concretizou. O Uruguai boicotou a Copa na Itália e é o único campeão que não jogou uma edição seguinte do torneio. O país-sede, por sua vez, participou das Eliminatórias (disputadas pela primeira vez), algo que nunca se repetiu.
Contudo, os italiano chegaram fácil ao Mundial e, com ainda mais tranquilidade, venceram a Copa - o primeiro de quatro títulos da Azzurra. À época sob o comando do regime fascista de Benito Mussolini, a Itália foi preparada e muito favorecida para levar o caneco. Na final, em Roma, bateu a Tchecoslováquia por 2 a 1, com gol de Angelo Schiavio na prorrogação.
Entre os italianos, vejam vocês, havia um brasileiro. Filó, conhecido na Bota como Guarisi, teve passagens por Corinthians e Portuguesa até chegar à Lazio. Naturalizou-se e jogou pela Azzurra, sendo o primeiro tupiniquim a vencer uma Copa do Mundo. Caso parecido foi o de Luis Monti, argentino convocado pela Itália. Curiosamente, em 1930, ele jogou o Mundial pelo seu país de origem, sendo vice-campeão.
Já o Brasil, dessa vez com jogadores de outros estados, perdeu sua viagem. Em um sistema de mata-mata, a Seleção Canarinho caiu logo na estreia contra a Espanha, 3 a 1, em Gênova, e voltou mais cedo para casa. Destaque para um certo Waldemar Brito, que se não fez tanto sucesso como jogador, foi o responsável por levar Pelé ao Santos, mais de 20 anos depois.
Naquela Copa de 1938... Leônidas fez travessura
A Copa de 1938, na França, foi a primeira em que o Brasil participou de verdade, indo longe. Aliás, fomos os únicos sul-americanos representados no torneio, já que os outros boicotaram novamente o Mundial. Com Leônidas da Silva no auge, a Seleção foi até às semifinais, onde caiu diante da Itália, que viria a conquistar o bicampeonato (na final contra a Hungria, vitória por 4 a 2 dos ainda fascistas).
O Brasil conquistou o terceiro lugar com um triunfo de 4 a 2 contra a Suécia (um dos maiores fregueses brasileiros de todos os tempos). Mas o jogo que marcou mesmo aconteceu ainda na fase de oitavas-de-final. Diante da Polônia, em Estrasburgo, o time comandado pelo técnico Ademar Pimenta empatou em 4 a 4 no tempo normal e precisou fazer 2 a 1 na prorrogação para seguir adiante.
O fato inesquecível dessa partida é o único gol de pés descalços da história das Copas do Mundo (e talvez do futebol mundial). Foi de Leônidas da Silva - artilheiro do torneio com sete gols- já na prorrogação. Dizem que a chuteira do Diamante Negro estourou e ele continuou jogando enquanto a consertavam. Há quem diga que ele fez de propósito. Fato é que o juiz não percebeu nada, já que trata-se de uma irregularidade (os jogadores devem estar com todos os equipamentos do uniforme). O gol deveria ser anulado.
Ou seja, antes de inventar a bicicleta (ou pelo menos consagrá-la), Leônidas já inventara a malandragem brasileira.
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* A coluna Domingueira do Pilat relembra os fatos que marcaram a história do esporte. Afinal, é preciso conhecer o passado para entender o presente e projetar o futuro.
Direto da Redação
Colunista: Ricardo Pilat
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